O exemplo da Virgem Maria, José e do Menino Jesus nos ensina sobre a vida familiar segundo o olhar divino. A família no mundo e na história é uma realidade complexa feita de inúmeras transformações sociais. O que era família na Grécia e Roma antigas, não tem nada a ver com o que chamamos família na atualidade. A família de Jesus Cristo nos indica novos caminhos de compreensão dessa realidade a partir do coração de Deus; e sugere uma nova via de humanidade para todos os povos. Eis algumas lições tomadas da Sagrada Família de Nazaré:
- A vida familiar não se resume à intimidade sexual, embora ela seja necessária e fundamental, um dom e um direito. Vivemos em meio à uma sociedade profundamente erotizada. Tudo remete à intimidade sexual: as roupas, as imagens, a propaganda, as redes sociais. Muitas pessoas sobrevivem com a exposição maciça de sua intimidade, sozinhas ou com outros; transformadas em produtos de consumo. O caminho da Sagrada Família é outro: lá a intimidade tem natureza mais espiritual quê material; e o que tem de material se edifica em serviço, entrega e doação mútuas, no silêncio do amor. É uma verdadeira loucura para a civilização de hoje.
- Acolher é amar; sem acolhimento, a vida corre perigo, como a vida de Maria, e do Menino Jesus, correram perigo. No mundo atual, acolher significa dar algo, via de regra material; e amar se resume a um sentimento, que se não surge espontaneamente, como o suor caindo do rosto num dia de calor, não tem sentido. Na Sagrada Família, acolher é amar. E amar é dar-se a si mesmo. Alí o amor é real e prático. Alí o amor é uma escolha, um estilo de vida, muito diferente dos nossos dias.
- Ser pai e ser mãe significa não apenas gerar, mas marcar a vida dos filhos com suas características humanas e cristãs fundamentais, assim o melhor de nós tem continuidade na história da humanidade. A Virgem Maria é a geradora do Filho de Deus, sua verdadeira Mãe segundo à carne. São José é o pai na sombra de Deus. Não fecundou sua esposa segundo a carne, mas transmitiu a Jesus mais que sua estrutura genética: ensinou-lhe a ser um homem judeu justo, santo e trabalhador. De fato, num mundo marcado pelo abandono, e necessárias adoções, também de crianças, onde a vida corre perigo desde o ventre materno, ser pai e mãe não significa apenas gerar pela intimidade sexual, nem sempre equilibrada e amorosa, mas mostrar o caminho da vida, para que a prática do amor cristão tenha continuidade na história.
- A presença é mais que o fisicamente presente, mas quem está presente permanece no coração: como a presença do Pai Eterno no coração do Filho durante a vida neste mundo; ou a presença de São José, em sua ausência temporal até a glorificação do Filho de Deus no Céu, onde se reencontram de novo para sempre, o Pai Eterno e o pai na sombra. A presença é um dom da memória que ama. A saudade também. Guardar na memória do coração é mais importante que viver junto. Por vezes, as escolhas da vida nos afastam dos pais e irmãos de sangue, mas isso não significa que não eles não habitem dentro de nós. Antes, é a memória do amor que alimenta a esperança do encontro, neste mundo ou na eternidade. É assim que aqueles que moram com Deus, também permanecem conosco.
- Um bom filho e filha se realizam quando se tornam verdadeiros pai e mãe, quer na carne, quer no Espírito. A menina-moça de Nazaré não é mais uma jovenzinha, tornou-se guardiã da vida. José não é mais um homem maduro solteiro, dedicado a um ofício para si e para os outros, tornou-se um guardião da vida do Menino Jesus. O Espírito Santo constituiu essas duas frágeis pessoas humanas em duas colunas para guardar e proteger seu Filho neste mundo até que pudesse viver e agir por si, como acontece com todos nós. José e Maria nos ensinam que só nos realizamos neste mundo quando não existimos apenas para nós, mas quando nos tornamos guardiões do que é mais sagrado para Deus: a vida humana.
A Sagrada Família de Nazaré é um sinal de Deus para a humanidade. E na sua fragilidade humana, nos ensina a vitalidade do amor que santifica. Não é uma família perfeita segundo à carne e segundo à vontade do ser humano, mas é perfeita para Deus, porque é o lugar que amor escolheu morar e permanecer. Ela nos mostra um novo caminho de humanidade, possível para todos se nos deixarmos ensinar, ouvir e educar pelo Espírito Santo.
Bom ano!
Padre Rodolfo Gasparini Morbiolo
Paróquia Santa Maria dos Anjos – Vitória Régia – Sorocaba/SP