Dr. Pe. Rodolfo Gasparini Morbiolo (agosto de 2025)
No último dia 29 de julho de 2025 aconteceu a formação setorial anual para catequistas na Paróquia São Guilherme de Sorocaba/SP. A reflexão comunicada aos mais de 100 catequistas presentes segue publicada abaixo para aprofundamento com manifestação de gratidão aos coordenadores (as) pelo convite recebido.
O tema “catequistas peregrinos da esperança” está situado no coração do Ano Jubilar que a Igreja vivencia em 2025 conforme convite do saudoso Papa Francisco. A peregrinação na esperança certamente não é apenas um convite esporádico vinculado à recepção das indulgências dos Anos Santos, mas uma nota fundamental do cristianismo. Somos todos peregrinos da esperança e na esperança; e nossa esperança viva é Jesus Cristo. Nossa peregrinação acontece na Igreja e com a Igreja, mas jamais fora do mundo, pois em meio às tristezas e alegrias deste tempo histórico de existência fazemos a experiência do encontro salvador com o Senhor e o comunicamos aos irmãos de humanidade e de fé, como razão da nossa vida espiritual. Esta é a alma da missão à catequese que prepara novas gerações para a vida cristã. Quem dera que todo cristão se descobrisse catequista em missão!
Na senda deste caminho de reflexão encontramos a palavra “esperança” citada uma única vez na Carta Apostólica (2021) por meio da qual o Papa Francisco instituiu a possibilidade do ministério do catequista na Igreja (Antiquum Ministerium, 6b). Ele o faz recuperando o texto de 1Pe 3,15 que convida todo cristão, mesmo no meio das perseguições, a dar a razão da sua esperança a todo aquele que lha peça. E que o faça com mansidão e respeito de modo que “sejam confundidos aqueles que ultrajam o vosso bom comportamento em Cristo” (1Pe 3,16). Assim estão vinculados na Escritura, a palavra e o exemplo, isto é, o bom comportamento em Cristo, sem o qual, a palavra se tornaria vazia e incapaz de transformar; seria talvez palavra humana, carente de espiritualidade concreta e encarnada. O que se espera de um bom catequista é seja um homem ou mulher, cristãos pelo batismo, de palavra que se faz carne em suas vidas, e se comunica com mansidão e respeito a todos.
A primeira carta de São Pedro é um documento do Novo Testamento de especial importância, pois carrega as notas da primeira grande catequese da Igreja para os catecúmenos em via dos sacramentos da iniciação cristã no primeiro e segundo séculos da difusão da fé. Não sabemos ao certo o quanto influenciou, mas é certa sua influência sobre o texto da Didaqué ou “Doutrina dos Doze Apóstolos”, bastante difundida no século II.
Afirma o Papa Francisco, recuperando o texto do “Diretório da Catequese” (2020), publicado pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização (PCPNE): “o catequista é simultaneamente testemunha da fé, mestre e mistagogo, acompanhante e pedagogo que instrui em nome da Igreja” (Antiquum Ministerium, 6b), transmitindo a fé recebida dos primeiros cristãos. Não é apenas uma missão, mas um verdadeiro ministério, tão antigo quanto a existência da própria comunidade cristã, porque está enraizado e entranhado nela, bebendo dessa fonte espiritual. E, por isso, se pode afirmar sem sombra de dúvidas, que o ministério do catequista nasce na comunidade, da vida em comunidade, em favor do mundo, convergindo para a comunidade, renunciando a proselitismos esvaziantes. O encontro com o Senhor Ressuscitado acontece no seio da comunidade cristã e a comunicação dessa experiência de fé manifesta o coração do cristianismo que anunciamos com a palavra e com o exemplo. Todo bom catequista é como Santa Maria Madalena correndo ao encontro dos irmãos, com imensa alegria, para comunicar a notícia central da fé: Ele vive, ressuscitou!
De fato, a forma do ensino da catequese variou bastante ao longo dos séculos. As próprias expressões “catecismo” e “catequese” como hoje são entendidos, não existiam nos primórdios do cristianismo. Embora houvesse apresentações primitivas dos conteúdos fundamentais da mensagem cristã, como ressaltados acima da primeira carta de São Pedro e da Didaqué, ou ainda “O pastor de Hermas”, os textos de São Justino e de Santo Irineu de Lião ou de São Policarpo de Esmirna (este último, discípulo direto de São João Evangelista como ensina a Sagrada Tradição Apostólica).
O século III vê o ápice do desenvolvimento do catecumenato como atestam muitas autoridades daquele tempo: Tertuliano, Cipriano, Clemente de Alexandria, Orígenes, entre outros. Culminando no século IV, com a época de ouro da catequese patrística, marcada pelos trabalhos de São Cirilo de Jerusalém, Santo Ambrósio e Santo Agostinho, cujos textos foram em muito recuperados no “Rito de Iniciação Crista de Adultos” de 1972, conforme o Decreto Ad Gentes do Concílio Vaticano II (n. 14).
O século VI vê um progressivo declínio do catecumenato, enquanto caminho de iniciação da vida crista, ficando relegado aos párocos e aos pais, enquanto cresce a difusão do batismo de crianças, já presente em algumas comunidades das origens. Só se é possível falar em “livro do Catecismo”, mil anos depois, por volta do século XVI, com a invenção da imprensa e a crescente alfabetização da população. Virá, então, o chamado “Catecismo de Concílio de Trento”. É depois da segunda metade do século XVIII, sob influência do Concílio Vaticano I (1870), do Papa Leão XIII (1878-1902) e do Papa Pio X (1905), que o movimento catequético começa a ganhar força, atingindo sua melhor expressão no Concílio Vaticano II (1962-1965), associado à valorização dos leigos e leigas na evangelização do mundo. O que seria de catequese atual sem o trabalho incansável dos leigos e leigas que garantem a alfabetização da fé de crianças, jovens e adultos na diversidade cultural das comunidades cristãs-católicas?
A catequese que temos hoje é, sem dúvidas, a melhor forma deste processo histórico de evangelização, pois conta com a comunidade como um todo naquele serviço desejado por Jesus Cristo de fazer chegar sua Boa Notícia até os confins do mundo (Mt 28,16-20), não apenas na comunicação do conteúdo da fé, mas antes de tudo, pelo exemplo e pelo testemunho, o que recorda os inícios da Igreja. A “Catequese Renovada” (1983), publicada pela CNBB, insere o Brasil na vanguarda catequética consolidando a forma, o método e o conteúdo, que bem depois seriam ressaltados no já citado “Diretório da Catequese” (2020) elaborado para o mundo cristão-católico inteiro. Está presente nestes textos a relevância de um olhar que contemple os desafios da vida no mundo e sociedade atuais, e a busca da luz de Cristo no Evangelho para encontrar respostas cristãs às dores e angústias de todos. Mesmo que nem todos queiram ouvir o que a Igreja deseja ensinar, os cristãos são chamados a associar um testemunho do amor cristão em suas palavras e atitudes que ensine o melhor caminho para ser humano hoje, conforme o ensinamento imortal de Jesus Cristo, consignado no Evangelho. E assim, aos catequistas está o desafio de gerar novos catequistas, uma vez que descobriram o coração de Cristo como morada, convidam novas gerações cristãs a redescobrí-Lo também. Um coração de Jesus aberto a todos; e uma Igreja de portas abertas, semelhante aos braços do Pai Misericordioso ao filho pródigo (Lc 15,11ss).
Não é difícil ser catequista. Se somos homens e mulheres que colocam sua esperança em Jesus Cristo; Seu seguimento e discipulado é o que temos de melhor para viver e ensinar. Assim, evangelizamos educando, e educamos evangelizando, transmitindo os valores cristãos que edificam nossa vida cristã, sem fechar os olhos para os desafios atuais, mas os respondendo a partir da Revelação do Amor de Deus em Cristo. Nossa esperança reside nas vidas transformadas pela força do Espírito Santo e nutridas pelos sacramentos, para servir de faróis cristãos espalhados pelos quatro cantos do mundo.
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Sugestões de leitura:
CNBB. Catequese Renovada (doc. 26, 1983). 2.ed. Brasília/DF: Edições CNBB, 2024.
FRANCISCO, Pp. Carta Apostólica “Antiquum Ministerium” sob a forma de “motu proprio” pela qual se institui o ministério do catequista (10, mai., 2021). Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/motu_proprio/documents/papa-francesco-motu-proprio-20210510_antiquum-ministerium.html. Acesso em: 31, jul., 2025.
LODIGIANI, Stefano. “Antiquum ministerium”: um novo ministério para um antigo serviço. Disponível em: https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2023-05/antiquum-ministerium-ministerio-novo-para-antigo-servico.html. Acesso em: 31, jul., 2025.
PCPNE. Diretório para Catequese (doc. 61). Brasília/DF: Edições CNBB, 2020.