Quando se fala de alegria, sobretudo da alegria evangélica, é comum que muita gente se pergunte: Como conservar a alegria se não tenho motivos? Não, obstante, contra a maré e como antídoto, o Papa propõe na Evangelli Gaudi que a firme esperança de que tudo ficará bem se estivermos com o Senhor, nos fará, mesmo em meios às agruras, antever a vitória.
Esta firme esperança de que tudo ficará bem com o Senhor ao nosso lado é bíblica! Para os momentos de angústia, a Palavra nos sugere: “Espera em silêncio a salvação do Senhor” (Lm 3,17ss). O Salmista, mesmo em meio à tribulação afirma: “Se a tarde vem o pranto visitar-nos, de manhã nos vem saudar a alegria” (Salmo 29). O Senhor Jesus disse, não negando, que vez por outra a tristeza poderá nos visitar: “vós haveis de ficar tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria” (Jo16,20).
O mundo de hoje não é alegre! A Organização Mundial da Saúde se preocupa com uma nova doença que atinge cerca de 500 milhões de pessoas no mundo, a Distimia. Esta, apesar de não privar o indivíduo de suas tarefas e obrigações, impede que a pessoa desfrute da vida totalmente. A doença caracteriza-se, segundo a OMS, pela falta de alegria na vida. Tais pessoas são desanimadas e/ou muito regradas (parecidas com os fariseus). Trata-se de um mau humor, ou uma irritação crônica. Basta dar uma olhada à nossa volta e perceberemos o quanto as pessoas andam irritadas!
Já que o mundo hodierno não é alegre, ele nos enche de ocupações. E nos enche tanto, que quando acontece de não termos nada para fazer, nos sentimos ociosos demais, ou enfadados, enojados, entediados. Assim, nascem, sobretudo nas redes sociais, aquelas pessoas que praticamente idolatram a “sexta-feira”, pois, arrastam a vida a semana inteira fazendo algo que não gostam, e extravasam no final de semana se excedendo nas bebidas e comidas.
O mundo confunde alegria com “euforia”, por isso há pessoas que “se divertem” nos bares no fim de semana, enchendo os copos, já que os corações andam vazios, até festejam e gargalham, mas para disfarçar o desespero e a desilusão. A alegria nada tem a ver com “euforia”, ou “adrenalina”.
Curioso é que a Palavra afirma em Eclesiástico: “afasta a tristeza para longe de ti, pois a tristeza matou a muitos” (Eclo 30, 22-27). Hoje, no século XXI, a ciência afirma que o principal alvo atacado pela Distimia é o sistema imunológico. Tanto é verdade, que os hospitais de oncologia infantil investem altas cifras em atividades que proporcionem alegria às crianças submetidas à quimioterapia. Vide, os famosos “doutores da alegria”. Quem está doente, mesmo com uma doença grave, deve ouvir este mandato do Senhor que nos chegou através de seu servo, o Apóstolo Paulo e hoje nos chega através do Papa Francisco: “Alegrai-vos no Senhor, repito, alegrai-vos!” (Filipenses, 4) Repito, quem está doente deve encontrar sim, um motivo para sorrir e aprender a ser alegre.
Santo Agostinho dizia: “Ó homem, ó mulher, aprenda a dançar senão os anjos do céu não saberão o que fazer contigo.” Ou seja, aprenda ser alegre já aqui na Terra, pois o Céu é Alegria! Nos diz o Papa Francisco: “O santo é capaz de viver com alegria e senso de humor”.
Interessante é que o mundo usa a palavra “alegria”, mas como algo que vem de fora para dentro: alegria artificial da droga, alegria de comprar um carro novo, uma roupa nova, de um status social, de um sexo sem compromisso, e até de uma alegria com a desgraça dos outros. Tudo não passa de rascunho de alegria. Por isso mesmo, temos jovens de 12, 14, 15 e 18 anos arrebentados pela tristeza! Estes jovens envelheceram antes do tempo.
Rubem Alves tem uma profunda reflexão sobre a alegria. Ele escreve:
“Era prazer? Era. Mas era mais que prazer. Era alegria. A diferença? O prazer só existe no momento. A alegria é aquilo que existe só pela lembrança. O prazer é único, não se repete. Aquele que foi, já foi. Outro será outro. Mas a alegria se repete sempre. Basta lembrar.”
A gente não se lembra do prazer que teve quando escorregou no tobogã e caiu em cheio naquela piscina, e tampouco a gente se lembra do prazer que aquela feijoada tão desejada nos proporcionou. Para sentir aquele prazer, é preciso fazer de novo, e o prazer já não será o mesmo, será outro! Ah! Mas a gente se lembra das pessoas queridas que estavam em volta daquela mesa, das histórias de família contadas nos domingos, de quando papai cantava pra gente ou nos carregava no colo… isso é ALEGRIA! Ela mora na lembrança, porque não passa! Já o prazer, mora no momento, porque é provisório.
Não é uma alegria de “sexta-feira”, ou de “feriado” que começa e acaba! Não! Não é também aquela alegria que gente fica esperando chegar depois da formatura, do casamento, do nascimento de nossos filhos, da casa nova, da loteria… dessa alegria que nunca chega. E nunca chega porque a alegria não mora no futuro, mas no presente! Ele nos faz antever a vitória, mesmo, talvez, em meio à derrota presente.
Lembro-me aqui, para concluir, do grande Adoniran Barbosa, que não sabia tocar instrumento nenhum, a não ser chacoalhar uma caixa de fósforo, e, entretanto, sabia fazer samba com a desgraça. Um dia, por exemplo, o Arnesto o convidou para um samba lá no Brás, mas chegando lá, não havia ninguém, e o Adoniran fez samba! Quando morreu sua Iracema, há 20 dias do casamento atropelada, ele canta no seu samba dizendo que o chofer não teve culpa. Talvez este homem fosse capaz de fazer isso, porque tinha um grande amor, afinal como ele mesmo cantava “minha mãe não dorme enquanto eu não chegar”. Quem tem um amor que não dorme enquanto não chega, não tem como não ser alegre! Temos um Pai, que Jesus revelou que é amor e uma Mãe, a Senhora Aparecida que não dorme enquanto você não chegar!
Pe. Wagner Lopes Ruivo
Pároco da Paróquia São José Operário
Arquidiocese de Sorocaba