É evidente por si a resposta: que seja um novo Papa, para um novo tempo.
E na Igreja, como já refletiu o também falecido Papa Bento XVI, quando se fala em descontinuidade, sempre se fala em continuidade. E assim, muda-se a pessoa, mas a missão contínua sendo a mesma. Francisco partiu, mas Pedro continua sua obra na história do mundo, agora pela pessoa de Leão XIV.
Algumas imagens têm marcado os primeiros dias do novo Papa. Sem dúvida falamos de sua visita ao Santuário de Nossa Senhora do Bom Conselho nos arredores de Roma, um local de afluxo de peregrinos e de recepção de mais de uma centena de milagres pela intercessão da Virgem Maria; também um santuário com referências agostinianas. Depois, em seguida, a imagem que encima este artigo: sua visita à sepultura do Papa Francisco, em oração silenciosa de joelhos na Basílica Papal de Santa Maior onde ele foi sepultado.
A estas imagens assomam outras. Depois do impacto emocionante de sua eleição, algumas fotos com gentil sorriso que faz penetrar a esperança no coração. Manteve seus sapatos pretos. Quando conduzido ao Santuário mariano que visitou usou vestes habituais brancas, sentou no banco do passageiro ao lado do motorista, desafivelou sozinho o cinto de segurança, abriu ele mesmo a porta do carro popular que estava usando para o trajeto. Podem parecer imagens banais, mas quem têm escutado a voz do Espírito nos últimos anos ecoando pelo ministério do papa falecido, sabem que essas imagens indicam clara continuidade em meio às mudanças próprias de qualquer transição. O mesmo se aplica à sobriedade do altar onde celebrou a Missa para os cardeais eleitores: simplicidade radicada na reforma litúrgica inaugurada pelo Concílio Vaticano II.
Em suas primeiras palavras, antes ainda da missa inaugural de pontificado que se dará no dia 18 de maio em Roma, onde é de praxe ecoar uma homilia programática de ministério, ele já insinua seus futuros passos. Aos irmãos bispos cardeais enfatizou que a escolha do seu nome realmente recorda o esforço de Leão XIII, há quase 150 anos atrás, de dialogar com o mundo pós-revolução industrial de seu tempo pela inauguração do ensino da Doutrina Social da Igreja. Doutrina que hoje precisa ser reproposta e anunciada em vista dos desafios da nova era de revolução das inteligências artificiais, que podem vir a degenerar a dignidade da pessoa humana inserida no mundo do trabalho; trabalho, que deveria lhe conferir dignidade em sociedade.
A ênfase no balcão do palácio apostólico onde foi apresentado à Igreja e ao mundo, como ainda em suas primeiras homilias e mensagens (e também nos gestos iniciais) ao ministério do Papa Francisco, dá claros indícios de que o papa falecido haverá de inspirar pelo menos os primeiros rumos de seu próprio ministério petrino.
Celebrando neste quarto domingo pascal, o dia do Bom Pastor, recordamos da experiência inicial de São Paulo, a rejeição que sofreu em uma sinagoga da diáspora, que o dispôs a ir mais longe, na direção dos que eram considerados pagãos, os gentios. Não sabemos quais as dificuldades de aceitação que o novo Papa enfrentará no seio da Igreja de Cristo (e também no mundo). A Palavra de Deus já o enfatizou que a perseguição mais desafiadora ao amor perseverante é aquela que procede daquele que é amigo, íntimo e familiar, e que caminha junto em direção à casa de Deus (Sl 54/55,14-15). Certamente, as portas fechadas, como para São Paulo, indicarão em que direção o novo Papa deve seguir para buscar as ovelhas perdidas deste tempo, como outrora fizeram cada um dos primeiros apóstolos do Cordeiro. Essas, certamente, serão as ovelhas que interessarão ao Bom Pastor do rebanho, a quem servimos todos nós sacerdotes do Senhor.
São Francisco de Assis teve um frei Leão como amigo e companheiro de jornada, também como secretário pessoal, copista de seus escritos e confessor pessoal. Ao Papa Francisco sucede outro Leão, ao papa jesuíta sucede um papa agostiniano, irmãos na vida religiosa e consagrada, irmãos no papado, mas como ressaltou o novo Papa, antes de tudo, irmãos em Cristo pelo dom da fé, na senda do ensino de Santo Agostinho: “convosco sou cristão, para vós sou bispo”.
Rezando juntos, entre nós e com ele, como evocou o novo Papa em sua apresentação, desejamos debruçados nos braços fortes da Virgem Maria e de São José, que o novo tempo inaugurado agora, com suas novidades, reascendam nos corações da Igreja e do mundo, a chama viva da esperança que ainda convida ao Ano Jubilar da Igreja de 2025. Na senda do Vaticano II, pelo caminho da sã doutrina social, pelo testemunho do falecido Papa Francisco, e agora pelo ministério de Leão XIV, avançamos confiantes rumos às coisas novas, “rerum novarum”, que já surgem aos olhos de todos: Não lhes vedes? (Is 43,19).
Padre Rodolfo Gasparini Morbiolo (Maio, 2025)




