Há pelo menos dois sentimentos transbordando de nossos corações católicos que acabaram de sofrer o abalo pós-pascal do passamento do Papa Francisco à eternidade. Partiu Francisco. Ficamos sem o papa, por enquanto. E assim: sede vacante não é apenas um ordenamento jurídico de transição da função episcopal exercida, mas também o nome de dois sentimentos diferentes que nos assomam neste momento. Ambos falam de perda, quer de alguém que à distância se fez amigo e próximo de toda a humanidade; perda, ainda, do líder mundial da nossa religião.
Acordei hoje pelas 4h da madrugada (hora do Brasil), com tosse, devido a uma rinite que ceifou parte da minha voz no final do Domingo de Páscoa, e pelo menos movido pelo hábito, tomei o telefone móvel para distrair o mal-estar. Imediatamente vi a foto publicada pela página do Instagram do Vaticano sinalizando a data de nascimento e morte do Papa. Vi, e não entendi por alguns instantes. Vi, e procurei outros canais para me certificar que ninguém teria invadido a página e divulgado notícias falsas. Vi, e não tive como não acreditar. Em pouco instantes, viria a público a declaração oficial do cardeal carmelengo. E o dia nasceu cinza e triste, embora seja Páscoa em nossos corações. Acordamos de mãos vazias.
Virão dias intensos para a sede vaticana da Igreja Católica: o tempo destinado às orações de exéquias do papa falecido e seu sepultamento conforme seu testamento, a convocação do conclave para eleição do futuro papa, o período de eleição e, finalmente, o início do novo papado.
No meio de tudo isto, continuamos imersos em nossos afazeres cotidianos e convivendo com os desafios midiáticos da atualidade. Embora os meios de comunicação da Santa Sé tenham divulgado todos os documentos orientadores dos processos e procedimentos que serão realizados, o burburinho nas redes de comunicação é inevitável, e como eles compreendem essa transição apenas do ponto de vista político, uma das preocupações de todo articulista acaba por ser sobre quem será o futuro papa.
É importante tomarmos cuidado de não cairmos na cilada de gastarmos energia com os falatórios paralelos que dificultam que nosso coração e afetos estejam sintonizados com a Verdade. Também cuidemos de não ouvidos às teorias conspiratórias que só servem ao interesse daqueles que desejam audiência para si, fazendo a esperança enfraquecer no coração. Por outro lado, fiquemos enraizados no Evangelho de Jesus e em sua força invencível de salvação.
É oportuno ler e meditar a vocação de São Pedro como papa da Igreja segundo a narrativa do Evangelho (Mt 16,13-20). Nesta passagem escutamos as seguintes palavras de Jesus que sempre ressoam em nossos corações: “tu és Pedro e sobre esta Pedra construirei a minha igreja, e o império da morte não a vencerá” (em outra tradução: “as portas do inferno não prevalecerão”). O contexto desta passagem manifestará o anúncio da paixão e ressurreição de Jesus; o mistério da páscoa que acabamos de celebrar. A fé de São Pedro está radicada na Cruz de Cristo e na força do Espírito que ressuscita para a vida eterna. Esta comunicação sagrada nunca falhará! E São Pedro, e os futuros Papas, são portadores dessa graça pascal.
Ainda é oportuna a leitura e a meditação das últimas palavras de Jesus ressuscitado aos seus discípulos depois de enviá-los em missão (Mt 28,20): “estarei convosco até o fim do mundo”. A presença de Jesus é real na Igreja. Celebramos esta presença na Eucaristia. Ele não assumiu nossa vida humana e a redimiu para depois descartá-la, mas permanece unido àqueles que amou até o fim, até o extremo da Cruz (Jo 13,1). E sua Igreja, comunidade de salvação, manifesta-se como continuadora da obra inaugurada e consumada pelo seu Fundador.
Esta hora da história do mundo, como outras ocasiões já a experimentaram, é tempo de oração com Cristo pela unidade da Igreja: que sejam um no amor para que o mundo creia (Jo 17,1-26), e todos vejam a glória do Senhor ressuscitado (Jo 13,31-35). Novamente Jesus se colocará diante de um novo Pedro e lhe perguntará se está disposto, por amor e amizade dEle, a apascentar como verdadeiro pastor Seu rebanho universal (Jo 21,15-18). A resposta que já esperamos, disporá um cardeal ao papado, mas também disporá um bispo ao pastoreio universal da Igreja, ministério que o conduzirá para mais perto do mistério da Cruz de Cristo, para que um dia, Outro, o Espírito Santo, lhe tome pela mão para conduzi-lo como testemunha de fé, pelo caminho do martírio cristão, à fonte da Vida.
Assim aconteceu com Jesus; assim, com São João Paulo II, também com Bento XVI; e agora com Francisco, e muitos outros antes deles. O modo como os santos terminam sua vida neste mundo, guardando a fé, é o testemunho mais eloquente da vitalidade espiritual da Igreja e da ação do Espírito Santo, que continua imolando seus corações no altar da história, para iluminar aqueles que habitam a escuridão da morte.
Não nos deixemos iludir, nem perder a esperança, pois Deus e suas surpresas, sempre excede a inteligência dos estultos. E no fim, a Cruz de Cristo peneira os verdadeiros servos e servas de Deus, e o império da morte não poderá vencer o Senhor que doa a Vida. E no fim, que ainda deve tardar, a Noiva de Cristo e o Espírito ainda haverão de dizer: Vem, Senhor Jesus! (Ap 22,17).
Para aprofundar:
Documentos sobre a Sede Vacante, Exéquias do Papa e Conclave:
https://www.vatican.va/content/vatican/pt/special/sede-vacante/sede-vacante-2025.html
Padre Rodolfo Gasparini Morbiolo (Abril, 2025)
Veja mais em: Biografia / Agenda do Arcebispo / Palavra do Pastor / Youtube / Redes Sociais
				
													



								
								