Naqueles dias foi publicado um decreto do imperador Augusto, ordenando o recenseamento do mundo inteiro. Esse primeiro recenseamento aconteceu quando Quirino era governador da Síria (Lc 2,1).
Com estas palavras, Lucas introduz a sua narrativa sobre o nascimento de Jesus e apresenta o motivo de ter ocorrido em Belém: José e Maria não foram a Belém para turismo; foram obrigados a se deslocar por um decreto imperial que ordenou o recenseamento do mundo inteiro.
A menção do imperador Augusto não é por acaso: serve para colocar em relação Jesus e César Augusto. O que eles têm em comum? Quais as diferenças entre eles?
Há uma inscrição histórica na qual vemos como o imperador Augusto queria ser visto e considerado. O nascimento do Imperador conferiu uma fisionomia diferente ao mundo inteiro. O mundo teria se arruinado, se não tivesse nele nascido e brilhado uma felicidade universal. A Providência, que dirige a nossa vida, cumulou este homem de tais dons para a nossa salvação e para a salvação das gerações futuras. O dia do nascimento do Imperador foi para o mundo o início de um novo tempo. A partir do nascimento do salvador deve começar uma nova contagem do tempo (tradução livre da Inscrição de Priene, 9 a.C.).
Notem que César Augusto deseja ser considerado “o salvador” (soter). O próprio título de “Augusto” possui uma conotação divina (sebastos = adorável). Como o salvador, ele começou uma nova era para a humanidade, por isso o tempo devia começar a ser contado a partir do seu nascimento.
Como Augusto, Jesus não é um mito; é um personagem histórico que pertence a um tempo e a um lugar: nasceu em Belém, no tempo do imperador Augusto, quando Quirino era governador da Síria, no contexto do primeiro recenseamento do mundo todo.
César Augusto se fazia chamar de salvador e de príncipe da paz, porque naquele tempo, todos ansiavam pela paz e justiça. A exemplo dele, os seus sucessores exigiram serem saudados como “restaurador do mundo”, “esperado do povo”, “restituidor da luz”. Os grandes da história, nesse sentido, nunca foram muito originais!
Para o senso comum, a mentalidade era a de que somente o forte e quem tem o poder dos exércitos pode impor a paz ao mundo (a pax romana) e trazer a salvação para a humanidade.
O que os anjos anunciam aos pastores arrebenta essa mentalidade! Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: Encontrareis um recém-nascido envolvido em faixas e deitado numa manjedoura.
O sinal do Salvador é um não-sinal: um recém-nascido, envolvido em faixas, deitado numa manjedoura! Somente Deus podia realizar uma mudança tão radical da lógica humana. Trata-se de um “não” radical àquilo que as pessoas sempre pensaram. Nós sozinhos nunca teríamos ousado afirmar tamanha reviravolta na escala de valores: o Salvador, o Príncipe da Paz, o Cristo Senhor é este recém-nascido envolto em faixas, deitado na manjedoura.
Jesus é desde o seu nascimento o imolado, e a manjedoura serve, ao mesmo tempo, de berço e de altar do sacrifício. Além disso, a manjedoura é o coxo onde os animais se alimentam. No natal, está deitado na manjedoura aquele que é o “Pão descido do céu” para ser nosso “Pão da vida”. A manjedoura se torna a mesa de Deus para a qual somos convidados para comer o Pão de Deus.
Na pobreza do nascimento de Belém se revela que o verdadeiro Salvador e o Príncipe da paz não é César Augusto, mas o recém-nascido envolto em faixas e deitado na manjedoura.
Neste Natal, deixemo-nos olhar pelo Senhor; permitamos que Ele venha a nós, e nos encontre, e nos ame, e nos olhe! Abraçados por esse Amor terno e pessoal do Verbo Encarnado, desejo a você e à sua família, um Santo Natal!
Por Dom Julio Endi Akamine SAC
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