Novo e novidade

Novo não é novidade. A novidade é liquida porque precisa ser continuamente substituída pela próxima. Pode ser intelectual ou material, mas a sua essência permanece: envelhece instantaneamente com o surgimento de outra novidade.

A novidade é o motor do consumismo e é a sua droga mais viciante. A descrição de F. Beigbeder, nesse sentido, é terrivelmente certeira: Eu vos vicio de novidade, e a vantagem da novidade é que ela nunca permanece como novidade. Há sempre uma outra novidade da última moda que torna velha a precedente. Minha missão é vos fazer babar de desejo. Na minha profissão, ninguém deseja a vossa felicidade, porque gente feliz não consome. O vosso sofrimento infla o comércio. No nosso jargão nós o batizamos de “frustração pós-compra”. Não podeis estar sem um artigo de consumo e logo que o comprais sentis a compulsão de adquirir outro. O hedonismo não é um humanismo: é um fluxo de caixa. O seu lema? “Compro, logo existo”. Para criar as necessidades é preciso estimular a inveja, a dor, a insatisfação: são essas as nossas munições. E o meu alvo sois vós (F. Beigbeder, Lire 26.900, Feltrinelli, Milão, 2016, p.3, 7).

Além de esvaziar o coração, a obsessão por novidades está na base da violência social. Quanto mais vazio está o coração da pessoa, tanto mais necessita de objetos para comprar, possuir e consumir. Em tal contexto, parece não ser possível, para uma pessoa, aceitar que a realidade lhe assinale limites; neste horizonte, não existe sequer um verdadeiro bem comum. Se este é o tipo de sujeito que tende a predominar numa sociedade, as normas serão respeitadas apenas na medida em que não contradigam as necessidades próprias. A obsessão por um estilo de vida consumista, sobretudo, quando poucos têm possibilidades de o manter, só poderá provocar violência e destruição recíproca (LS 204).

Ao contrário, o novo é um evento que renova a vida. Não pode ser comprado por dinheiro nem reivindicado por merecimentos pessoais. Não pode ser conquistado; simplesmente acontece e, ao irromper inesperadamente, dá sentido à vida.

O Evangelho descreve o encontro de Simeão com o menino Jesus, quando este foi levado por Maria e José ao templo de Jerusalém (Lc 2,22-35). “Movido pelo Espírito”, Simeão reconheceu entre a multidão um pobre casal que levava o filhinho para ser apresentado ao Senhor. Porque não era movido por preconceitos, pôde reconhecer na humildade da aparência o Cristo Salvador e constatar que sua vida tinha valido a pena. “Agora, Senhor, podes deixar o teu servo ir em paz”, exclamou.

Também a profetisa Ana, teve a felicidade de se encontrar com o menino (Lc 2,36-38). Ela prorrompe em um canto de louvor a Deus, pois constata que a sua longa existência se conclui com o encontro com o Senhor.

O fato de ser um dom imerecido não torna inútil a liberdade humana, ao contrário, é o novo que suscita e eleva a liberdade. Mesmo que não possamos possuí-lo, devemos, todavia, recebê-lo. Simeão e Ana, surpreendidos pela irrupção do novo, tem a própria liberdade interpelada, pois a oferta de uma nova vida exige o empenho pessoal pela renovação da vida.

O novo não envelhece. Permanecendo o mesmo, tudo torna novo. Novo e felicidade coincidem: o primeiro é a forma, a segunda é o conteúdo; o primeiro indica o modo como nos atinge, a segunda é o estado no qual somos conduzidos.

Quando o novo renova a vida, caímos na conta de que a felicidade dispensa muitas necessidades artificialmente criadas e nos faz limitar as que nos entorpecem. Nesse sentido, o novo nos torna mais abertos para as múltiplas possibilidades que a vida oferece (LS 223).

Desejo a você querido(a) leitor(a) um ano verdadeiramente novo e não somente cheio de novidades.

Foto: John Kevin / iStock

 

Por Dom Julio Endi Akamine SAC

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