Sábado da 5ª Semana TC
Gn 3,9-24
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Depois de terem comido do fruto proibido, Adão e Eva se ocultam de Deus. Questionados por Deus, o homem e a mulher apresentam desculpas esfarrapadas e jogam a culpa no outro. O homem acusa a mulher e Deus: “A mulher que tu me deste por companheira, foi ela que me deu do fruto da árvore e eu comi”. Não é isso o que acontece conosco todos os dias? Arranjamos desculpas e jogamos a culpa nos outros e em Deus!
A mulher, por sua vez, responde: “A serpente me enganou e eu comi”. A mulher fala a verdade: a serpente enganou. Ao mesmo tempo, porém, reconhece que o ato foi consciente, livre e por isso responsável: “eu comi”.
Uma vez que se trata de ato responsável, a punição se realiza não como uma sanção extrínseca, mas como consequência do próprio ato. Sempre imaginamos o castigo de Deus como uma sanção externa e nos revoltamos com uma punição que nos parece injusta. Se, porém, formos menos cegos, teremos que reconhecer que o castigo, na realidade, é a consequência das nossas escolhas: se eu abuso da saúde na juventude, certamente me condenarei a uma velhice insalubre; se não administro com responsabilidade meu dinheiro, terei como resultado minha falência financeira; se não estudo para a prova, não poderei superá-la.
Quais são as consequências do pecado, segundo o relato do Gênesis?
A consequência é a ruptura. O homem culpa a mulher e Deus. A mulher põe a culpa na serpente. São sempre os outros o culpado, mesmo que a responsabilidade pessoal seja evidente. Esse comportamento reflete bem o que nós também fazemos quando somos surpreendidos no pecado.
Há uma ruptura entre o homem e a terra, entre a mulher e o homem, entre o homem e Deus.
A terra que foi criada para ser produtiva e fecunda, porém, ela produzirá para o homem espinhos e cardos. O trabalho do homem será marcado pelo esforço e cansaço com pouco resultado: “comerás o pão com o suor do rosto”. O homem que foi tirado do pó da terra e se reconhece ligado à terra: experimentará essa ligação não como uma pertença harmoniosa e feliz (veja o hino das criaturas de S. Francisco), mas como uma antecipação da morte e do fim: “até voltares à terra de que foste tirado, porque és pó e ao pó hás de voltar”. Deus toma o cuidado de não amaldiçoar o homem. Ele amaldiçoa a terra por causa do homem. Não é Deus que amaldiçoa diretamente, mas a terra se torna amaldiçoada por causa do homem.
A ruptura se estende à mulher em duas formas. Primeiramente a ruptura entre ela mesma e o que lhe é próprio: a maternidade. “Multiplicarei os sofrimentos da tua gravidez: entre dores darás a luz os filhos”. A mulher perdeu a harmonia com aquilo que é próprio de sua natureza de mulher: sua capacidade de gerar filhos.
Além disso ocorre a ruptura entre mulher e homem: “teus desejos ter arrastarão para o teu marido, e ele te dominará”. É próprio da dinâmica erótica que sejamos atraídos pelo sexo oposto. Essa atração deveria nos abrir ao encontro pessoal e à comunhão de vida. O pecado, porém, perverte a atração erótica em dominação e violência.
Mesmo que o homem e a mulher tenham pecado e por isso punidos, Deus não os abandona. Sinal da providência e do amor de Deus consiste no fato de Deus ter feito para Adão e Eva túnicas de pele e os ter vestido. É um gesto pequeno de grande delicadeza.
O maior gesto de amor por parte de Deus, porém, está na promessa: “porei inimizade entre ti (a serpente) e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. Já desde o início, Deus decretou a reparação da ruína provocada pelo pecado. Assim no próprio relato do pecado está presente o sinal da misericórdia divina. É o que a tradição chamou de protoevangelho.
Por Dom Julio Endi Akamine SAC
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