Quarta-feira 27a Semana TC
Lc 11, 1-4
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“Estando num certo lugar, orando, ao terminar, um de seus discípulos pediu-lhe: Senhor, ensina-nos a orar, como João ensinou a seus discípulos” (Lc 11,1). Em resposta a esse pedido o Senhor confia aos discípulos e à Igreja a oração cristã fundamental.
A oração não é ato primeiro; ela é ato segundo, porque nasce de um choque existencial. A oração do Pai-Nosso só se entende no interior da profunda experiência vivida por Jesus.
Lucas coloca em relação o Pai-nosso com a oração pessoal de Jesus. Ensinando aos discípulos o Pai-nosso, Jesus não transmite somente uma fórmula (um ensinamento em forma de prece), mas nos introduz no diálogo interior do Amor trinitário e no envio que o Pai faz do Filho e do Espírito Santo a nós. Assim Jesus nos eleva ao coração de Deus e nos insere na sua missão no mundo.
O significado do Pai-nosso vai além da comunicação de palavras. Quer formar em nós os sentimentos de Jesus (Fl 2,5). Tertuliano escreveu: o Pai-nosso é o compêndio de todo o evangelho.
O Pai-nosso provém da oração personalíssima de Jesus, do diálogo do Filho com o Pai. Essa é a profundidade para a qual as palavras nos remetem.
“A oração dominical é a mais perfeita das orações. Nela não só pedimos tudo quanto podemos desejar corretamente, mas ainda segundo a ordem em que convém desejá-lo. De modo que esta oração não só nos ensina a pedir, mas ordena também todos os nossos afetos” (Sto. Tomás de Aquino, s. th. II-II, 83,9).
Na sua Regra, São Bento cunhou a fórmula: mens nostra concordet voci nostra (o nosso espírito concorde com a nossa voz (Reg 19,7). Normalmente o pensamento precede a palavra, busca e forma a palavra. Mas na oração (dos salmos, da liturgia, do Pai-nosso) acontece o contrário: a palavra, a voz nos precede, e o nosso espírito deve se adequar a essa voz. De fato, nós não sabemos o que convém pedir (Rm 8,26). Na oração do Pai-nosso, o Senhor vem em nosso auxílio e nos ensina a rezar e o que convém pedir. Dá-nos, nas palavras do Pai-nosso, a oportunidade de ir ao seu encontro e de conhecê-lo pouco a pouco através da oração pessoal e comunitária.
Na doutrina e na oração do Senhor, o Espírito dá forma nova aos nossos desejos (= moções interiores que animam nossa vida). Jesus nos ensina a vida nova por sua palavra (doutrina) e nos ensina a pedi-la pela oração.
Da retidão de nossa oração dependerá a retidão de nossa vida em Cristo e a retidão da nossa missão. A oração interpreta nossos desejos diante de Deus, mais exatamente expressa os desejos do Filho que se tornam nossos. A oração é um caminho de purificação de nossos desejos: os corrige e nos conduz pouco a pouco a desejar o que realmente precisamos: Deus e o seu Espírito.
O dom de Deus é Deus mesmo. A “coisa boa” que o Pai dá consiste no dom de Si mesmo: “quanto mais o Pai vosso celeste dará o Espírito Santo aos que lhe pedem” (Lc 11,13).
Jesus não nos deixa uma fórmula a ser repetida maquinalmente. Ele não nos dá só as palavras de nossa oração filial, mas nos dá ao mesmo tempo o Espírito pelo qual elas se tornam em nós “espírito e vida” (Jo 6,63). No Pai nosso fica evidente um elemento próprio da mística cristã. A oração não é um mergulho em si mesmo, mas encontro com o Espírito de Deus na palavra que nos precede, é encontro com o Filho e com o Espírito Santo e, dessa forma, um entrar em comunhão com o Deus vivo.
Por Dom Julio Endi Akamine SAC
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