31º domingo do TC B
Mc 12, 28-34
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Qual é o primeiro de todos os mandamentos? Esta pergunta do escriba era um assunto que mexia com as pessoas e causava muita discussão. A Lei de Moisés tinha sido inflacionada por muitas prescrições tradicionais, por explicações e reinterpretações. Por isso a pergunta era muito espontânea. Na realidade, perguntar sobre o primeiro dos mandamentos significava: o que é essencial entre tantos mandamentos, qual é o princípio que dá unidade a todas as prescrições?
A resposta de Jesus foi simples e, ao mesmo tempo, estupenda: amar a Deus e amar o próximo. São dois mandamentos incindíveis em sua unidade. “O amor a Deus e o amor ao próximo são como duas portas que se abrem simultaneamente: é impossível abrir uma sem abrir a outra, impossível fechar uma sem fechar, ao mesmo tempo, também a outra” (Kierkegaard, Diário II, 201).
Sem esquecer essa unidade, gostaria de concentrar a atenção sobre o amor a Deus: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com toda a tua força”.
O primeiro problema: mandamento de amar a Deus? É próprio da natureza do amor a liberdade. Um amor imposto não é amor. O amor é a coisa mais livre e não pode ser imposto por um mandamento externo. Além disso, Deus não deseja um amor coagido. “Depois que experimentamos o amor das pessoas livres, as reverências dos escravos não têm mais valor” (Charles Péguy).
O segundo problema: o cumprimento de um mandamento torna o amor frio. Nós estamos fartos de amor frio! Mesmo que não possamos por toda a culpa na pandemia, essa pandemia nos deu uma amostra do que pode ser um amor frio. Será que Deus quer para si um amor frio? Repitamos o que Jesus disse: “amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com toda a tua força”.
Para superar o primeiro problema é preciso entender que o amor é a causa, e não o efeito do mandamento. Amo e por isso me sinto obrigado a amar. E tal obrigação não me tira a liberdade. Somente quem ama tem a experiência de se obrigar a amar sem se ser coagido a amar. A obrigação de amar é apenas o sinal visível do amor invisível. A obrigação de amar é a comprovação do amor que já existe e está presente entre amante e amado. A obrigação de amar é a autenticação concreta do amor espiritual.
Para resolver o segundo problema é preciso compreender que o mandamento não torna o amor frio porque nós só nos sentimos obrigados a amar Deus porque Ele nos amou por primeiro. “Amor com amor se paga”. Porque nos amou por primeiro, Deus nos comunicou com o seu amor a felicidade de amá-lo e de corresponde ao seu amor. Deus é sumamente feliz porque ama infinitamente. Ele não que, Ele não sabe, Ele não pode a não ser amar infinitamente e nisso Ele é feliz. Ao nos amar por primeiro, ele derrama em nós o seu amor que é capacidade infinita de se dar e de se doar ao amado. Nós chamamos esse amor comunicado de graça. São Paulo nos fala do dom do Espírito derramado em nosso coração e que nos impele a chamar Deus de Abbá. Chama-lo Abbá, entenda-se bem, não só com palavra e de boca, mas com a espontaneidade do filho experimenta ao correr e abraçar o pai.
O mandamento do amor a Deus de Jesus nunca tem como resultado um amor frio. Pois na experiência do amor de Deus que nos ama por primeiro é impossível separar o amor “de” Deus e o amor “para” Deus. Essas duas realidades só podem ser experimentadas juntas: quando nos sentimos amados por Deus (amor “de” Deus), esse mesmo amor é simultaneamente um amor para Deus. Sentir-se amado por Deus é já amar a Deus. Não podemos separar esses dois amores como não podemos separar o amor a Deus e ao próximo: ao amor “de” Deus é já um sinal do amor “para” Deus.
Peçamos sempre, supliquemos com frequência, desejemos até o fim da vida que Deus nos dê o seu amor nos amando e permitindo que o amemos. Senhor, “dá-me um sinal de benevolência” (Sl 86,17); dá-me um sinal de que me queres bem; faz que eu faça a experiência do amor filial de Jesus para que meu coração se alargue e eu corra no caminho de teus mandamentos (cf. Sl 119,32); faz que eu te ame acima de todas as coisas e todas as coisas em ti; faz que eu te procure sempre para sempre te encontrar; que não haja “em meu coração outro Deus fora de ti”. Faz enfim que eu te ame como sou amado.
Por Dom Julio Endi Akamine SAC
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