1º. Domingo da Quaresma A
Mt 4,1-11
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Bem-vindos à Quaresma e à Campanha da Fraternidade. Jesus nos pede: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16).
Neste primeiro domingo da quaresma, ouvimos a proclamação do drama vivido por Jesus logo depois do Batismo no Jordão: a tentação no deserto.
Ao iniciar o seu ministério público, Jesus é conduzido pelo Espírito ao deserto. No Batismo de Jesus, o Espírito se manifestou e pousou sobre Jesus. Esse mesmo Espírito agora leva Jesus ao deserto “para ser tentado pelo diabo”.
A tentação de Jesus não consiste em uma solicitação ao mal: Jesus nunca desejou o mal e sua vontade sempre foi a de fazer a vontade do Pai. A tentação de Jesus consiste em tentação messiânica. No deserto Jesus precisa escolher que tipo de messias ele será; deve resolver como realizará a sua missão salvadora. O diabo quer que Jesus escolha o caminho mais fácil e de melhor aceitação (mais mercadológico e de sucesso) de um messianismo triunfalista, materialista e milagreiro. Jesus, no deserto e durante toda a sua vida, desmascarou esse projeto como diabólico.
No deserto, Jesus se entrega a oração e ao jejum. Ele busca o Pai e a sua vontade, quer estar em sua presença e companhia. De fato, Jesus é o filho muito amado no qual o Pai se agrada. Depois de jejuar 40 dias, Jesus sente fome. Ele busca o Pai, mas o que Ele experimenta é a necessidade humana de comer. Nesse momento o Tentador vê a oportunidade para atacar Jesus. “Se és Filho de Deus (o filho muito amado no qual o Pai pôs o seu agrado), manda que estas pedras se tornem pães”. O Tentador é oportunista, percebeu a necessidade e se mostra como bom conselheiro: “Afinal, se tu és realmente amado pelo Pai, se o Pai não dá uma pedra quando o filho lhe pede um pão, nada mais justo que ‘transformar as pedras em pães’. O Pai precisa provar que, de fato, te ama através de um milagre”.
Jesus fez muitos milagres, mas nunca fez milagres para provar que é Filho de Deus nem para obter a prova da paternidade de Deus. Ceder à proposta do diabo seria se render ao anti-projeto dele: fazer milagres para se impor às consciências ou, pior, para comprar as pessoas.
Pelo contrário, quando, depois da multiplicação dos pães quiseram fazê-lo rei, Jesus se retirou. O pão é importante para Jesus, e ele se preocupa com os famintos, mas o pão não é tudo. Mais necessário do que o pão é a Palavra.
A resposta de Jesus torna clara essa primazia que ocupa a vontade do Pai. Se o Filho é realmente filho, ele confia no Pai, e não precisa que o Pai prove a sua paternidade por um milagre inútil. Por isso, o Filho Jesus vive não somente do pão, mas “de toda palavra que sai da boca de Deus”. Quem confia no Pai pode sempre contar com o seu socorro.
O diabo não desiste e, astuto como é, se aproveita do que Jesus lhe respondeu para voltar a atacar, agora de maneira ainda mais sutil e perigosa. Ele desafia Jesus: “Se és Filho de Deus, lança-te daqui abaixo! Pois está escrito: ‘A seus anjos Ele dará ordens a teu respeito; e, nas mãos ter carregarão, para que não firas teu pé em alguma pedra’”. O diabo cita Sl 911s!
A resposta de Jesus, novamente revela a manipulação que o diabo faz da Escritura: “Também está escrito: ‘Não tentarás o Senhor teu Deus, e só a Ele servirás’”. Com a citação de Dt 6,16, Jesus mostra que se atirar do pináculo do templo não é expressão de confiança em Deus, mas uma chantagem que ofende Deus. Não devemos exigir o milagre a Deus: não devemos nos servir de Deus, nós devemos servi-lo. Exigir de Deus um milagre é tentar Deus. O messianismo de Jesus não é, como desejava o diabo, um show de milagres para conquistar maior audiência (mais ibope, mais curtidas, mais prosélitos). Jesus não é um milagreiro e não revela o Pai como quebra-galho do qual nos servimos.
A terceira tentação é a mais perigosa e terrível. O diabo mostra a Jesus, num só relance, “todos os reinos e a sua riqueza”. “Todos os reinos e a sua riqueza!” É difícil imaginar como deve ter sido essa visão! Jesus teve uma visão! É uma visão totalizante, uma visão clara, uma visão que abre a inteligência para um mundo de oportunidades e possibilidades inimagináveis. Essa visão que se dirige à inteligência de Jesus está vinculada um desejo que se dirige à vontade! É a visão do diabo sobre o mundo: “todos os reinos e sua riqueza”! Mas há um preço a ser pago para poder possuir tudo isso. O diabo diz qual é o preço para possuir “todos os reinos e a sua riqueza”: “tudo isso te darei, se te prostrares para me adorar”. O diabo exige ser adorado no lugar de Deus.
A resposta de Jesus corta na sua raiz a tentação de querer se substituir a Deus. Sim, é próprio do Diabo querer ocupar o lugar de Deus e de fazer os seus servidores pensarem que podem ser Deus sem Deus e em oposição a Ele. “Adorarás o Senhor, teu Deus, e só a Ele prestarás culto”. Só Deus pode ser adorado! E além disso, se Deus não for adorado, acabaremos por nos prostrarmos para adorar o diabo.
Neste tempo da Campanha da Fraternidade queremos ir com Jesus para o deserto, para com e por Ele lutar contra as tentações.
A fome ceifa ainda inúmeras vítimas entre os muitos Lázaros, a quem não é permitido sentar-se à mesa do rico avarento. Dar de comer aos famintos (cf. Mt 25, 35.37.42) é um imperativo ético para toda a Igreja, que é resposta aos ensinamentos de solidariedade e partilha do Senhor Jesus. Além disso, eliminar a fome no mundo tornou-se também um objetivo a alcançar para preservar a paz e a subsistência da terra.
Por Dom Julio Endi Akamine SAC
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